quinta-feira, 24 de julho de 2014

Petição: Lei que regule o que as autarquias regulam




A PETIÇÃO DA FPA
QUER

Lei que regule o que as autarquias regulam


Em meados de Julho de 2014, período em que é previsível que uma maioria de autocaravanistas viaje, a FPA lança uma Petição Pública para a “criação de uma política nacional, justa e equilibrada, de acolhimento ao autocaravanismo. Contra a discriminação negativa no estacionamento a que os autocaravanistas estão sujeitos (ver AQUI).

O direito de petição está contemplado na Lei n.º 43/90, de 10 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 6/93 de 1 de Março, Lei n.º 15/2003 de 4 de Junho e Lei n.º 45/2007 de 24 de Agosto (ver AQUI).

A banalização do exercício do direito de petição está a contribuir progressivamente para o desinteresse dos cidadãos em exercerem o direito cívico de apresentarem pedidos ou propostas a um órgão de soberania ou a qualquer autoridade pública no sentido de que tome, adote ou proponha determinadas medidas. Para que tal desinteresse seja combatido e diminua há que enquadrar e justificar prévia e detalhadamente os objetivos da petição. Foi o que a FPA não fez, nem nunca sequer tornou público um esboço do que considera uma Lei que defina a tal “política nacional, justa e equilibrada, de acolhimento ao autocaravanismo”.

É sabido que a FPA nunca definiu em documento público o que entende no concreto por “uma política nacional, justa e equilibrada, de acolhimento ao autocaravanismo” e também se não conhece qualquer documento em que defina e se pronuncie contra a discriminação negativa do veículo autocaravana. O que se conhece, é público e é contrário aos interesses e direitos dos autocaravanistas, está na carta que a FPA escreveu ao Deputado Mendes Bota e que mereceu da parte da “Associação Autocaravanista de Portugal – CPA” o seguinte comentário:

“ (…) uma federação que escreve ao Deputado José Mendes Bota, autor de um Projeto de Lei que pretendia impedir as autocaravanas de estacionarem em locais que lhe não fossem destinados, lamentando ainda, essa federação, que o Projeto de Lei não tivesse sido aprovado e tendo esperança que pudesse vir a ser reacendido.” (ver AQUI)

É também público o 6º Comunicado de 26 de Maio de 2014 da FPA em que é clarificada a política de estacionamento que esta associação defende para o autocaravanismo.

Diz a FPA:

Defendemos que o estacionamento de curta duração (até 48 horas) deverá ser permitido, nos termos do Código da Estrada, e nas mesmas condições em que o for para as restantes viaturas com o mesmo gabarito das autocaravanas.” (Mas, se o Código da Estrada permite que todos veículos possam estar estacionados até um máximo de 30 dias, porque razão quer a FPA cercear esse direito às autocaravanas? Não é isto discriminação negativa?)

Acrescenta ainda a FPA:

Só o estacionamento de duração superior deverá ser encaminhado para parques da especialidade.

Se esta nova filosofia que a FPA defende fosse colocada em forma de Lei, verificar-se-ia o seguinte:

1º - As autocaravanas poderiam estar estacionadas em qualquer local em igualdade de circunstâncias com qualquer veículo de igual gabarito, mas só até um máximo de 48 horas;

2º - Após 48 horas qualquer outro veículo de igual gabarito ao da autocaravana poderia manter-se no mesmo local até um máximo de 30 dias, enquanto a autocaravana seria obrigatoriamente encaminhada para parques de especialidade que até poderiam ser pagos;

3º - Os autocaravanistas com este tipo legislação defendida pela FPA seriam obrigatoriamente encaminhados para Parques (de Campismo ou outros), pois a sua igualdade e liberdade só durava 48 horas.

Conclusão (ver AQUI): A FPA quer que as autocaravanas sejam discriminadas.

Sendo estes, como atrás se demonstra inequivocamente, os objetivos legislativos da FPA, não se compreende a que leis se refere a FPA (no 3º parágrafo da Petição) quando, reportando-se às Posturas Municipais, lamenta a não existência de uma legislação hierarquicamente superior para impor baias às ditas Posturas, pois que, até que neste particular, comete, no mínimo, um erro de avaliação. É que existe uma lei superior, inclusive de âmbito internacional, que é conhecida como Código da Estrada.


Existem opiniões jurídicas que também corroboram o entendimento de que já existe uma lei superior às Posturas Municipais, designadamente a do Gabinete Jurídico da Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal (ver AQUI) que em 23 de Março de 2012, no ponto 5 do parecer, informa:

Há municípios que, para além de possuírem espaços destinados exclusivamente ao estacionamento e pernoita de autocaravanas, proíbem o estacionamento e pernoita de autocaravanas noutros locais em que o estacionamento e pernoita é permitido aos demais veículos, ao que julgo saber através de posturas municipais, nuns casos, e através de mera sinalização, noutros casos. Em minha opinião estas posturas e esta sinalização proibitiva do estacionamento e pernoita de autocaravanas é ilegal, na medida em que contraria normas legais de nível superior - o Código da Estrada - e opera uma discriminação infundada.

Esta proteção jurídica dada pela Lei, o Código da Estrada, era (é) um obstáculo legal já reconhecidamente assumido no documento “Caraterização do Autocaravanismo na Região do Algarve e Proposta para definição de uma Estratégia de Acolhimento” da Autoria do CCDR-Algarve (serviço dependente do Ministério da Economia) e divulgado em Julho de 2008.

Um alerta para o título do Documento do CCDR-Algarve na parte em que se define como uma “Proposta para Definição de uma Estratégia de Acolhimento”, pois que comparando-o com o título da Petição da FPA “ (…) política nacional, justa e equilibrada, de acolhimento ao autocaravanismo.” constata-se alguma semelhança. Ambos (CCDR-Algarve e FPA) querem acolher os autocaravanistas. (Pessoalmente dispenso o tipo de acolhimento que me preparam.)

Mas se na Petição da FPA não se refere em que termos se deve verificar o acolhimento ao autocaravanismo já a CCDR-Algarve, na Proposta Final do documento em questão (páginas 126 a 129) é muito clara na legislação que pretende ver implementada (ver ponto 14, página 128) quando preconiza o seguinte:

Autonomizar a figura das autocaravanas dentro da classe de veículos ligeiros/pesados especiais uma vez que não se destinam unicamente ao transporte de passageiros e ou de mercadorias (Art.º 106 do CE). Desta forma permitir-se-á a proibição de estacionamento destes veículos específicos fora dos locais destinados para o efeito, o que atualmente não acontece uma vez que só é permitida a proibição em determinados locais (artigo 50f do CE); - “É proibido o estacionamento… nos locais reservados mediante sinalização ao estacionamento de determinados veículos” (Art.º 70 do código da estrada)” (Sublinhado da nossa responsabilidade). (ver AQUI)

Defender-se a existência de Leis especificamente autocaravanistas, como o faz a FPA e as respetivas associações federadas, sem, contudo, vir publicamente esclarecer qual o conteúdo que se pretende para essas novas Leis e em que aspetos elas trariam para os autocaravanistas regulamentação que já não exista é o mínimo que se espera de uma associação consciente. A FPA está desfasada da realidade da sociedade em que nos encontramos e acredita (ou quer acreditar) que uma Lei sobre Autocaravanismo se iria debruçar exclusivamente sobre os desejos dos autocaravanistas, não considerando que outros interesses instalados, de elevado poder económico, que obviamente se esforçariam para que da Lei resultasse a proteção de interesses próprios que poderiam vir a ser nefastos para o autocaravanismo. Esta falta de visão levou, inclusive, a que os que defendem a existência de Leis especificamente autocaravanistas quisessem ressuscitar, como o fez a FPA e atrás se disse, um antigo projeto Lei que discriminava negativamente o autocaravanismo, o que, felizmente, não se concretizou (ver AQUI).

Consciente ou inconscientemente (há que dar o benefício da dúvida) a FPA, na Petição, apenas vem requerer, objetivamente, a “publicação de legislação que de forma abrangente forneça diretivas para a elaboração de outras regras menoresporque, diz a FPA, importa regular a publicação avulsa de regras (leia-se “publicação avulsa de Posturas Municipais”).


O irrealismo desta dita Petição, na atual conjuntura politica, é por demais evidente para necessitar de fundamentação e pode vir a contribuir para abrir caminho a legislação que discrimine negativamente as autocaravanas e o autocaravanismo, bastando para isso que os legisladores deem cobertura ao 6º Comunicado de 26 de Maio de 2014 da FPA a que atrás é feita referência analítica.

Para quem não entendeu o que a FPA quer (por favor não se riam!) o melhor é concretizar:

A FPA quer que a Assembleia da República aprove uma Lei que regule e coloque baias às Posturas Municipais sobre o estacionamento das Autocaravanas.

ASSINAR UMA PETIÇÃO PARA PERDER DIREITOS?


NOTA: Na próxima Quinta-feira, na continuação deste assunto, abordarei as “ideias” contidas no Comunicado 007/2014 da FPA. Entretanto e para os mais interessados, sugiro a leitura do artigo de opinião “Anatomia de uma Federação” (ver AQUI)




(O autor, todas as Quintas-feiras, no Blogue do Papa Léguas Portugal, emite uma opinião sobre assuntos relacionados com o autocaravanismo (e não só) –  AQUI)  

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